Voltas memoráveis
As ruas estão mais largas, como se quem as projetou soubesse que há que dar espaço à saudade. Deixá-la espalhar-se por todos os cantos e becos, e ficar a vê-la a desaguar no rio.
Quem se senta na esplanada não sabe que o seu corpo assenta em pedaços da minha história. Fica ali, na leveza de um gole de cerveja, no mesmo lugar onde o meu avô me levava pela mão para comprar pão.
- Trouxeste o teu avô a passear?
E eu sorria, envergonhada, a tentar desaparecer atrás dele.
Era uma algazarra boa. Vozes altas que não me assustavam. Gargalhadas vindas de sítios que eu não compreendia. Palmadas nas costas e pancadas na nuca, como faziam os miúdos da escola.
O largo da praça não tem largura suficiente para as memórias que carrego comigo.
O canto do Fragoso agora é um espaço vazio, forrado a jornais que debitam notícias antigas. Espreito e não vejo a minha avó debruçada ao balcão a escolher camisas.
É uma volta sem volta, esta de passear com vidas atreladas. É que nunca a volta vai ser tão memorável como as outras voltas que se deram antes.