Há um funeral na minha cabeça e não sei o que vestir
Há um funeral na minha cabeça. Constante e repetido, como o soar dos sinos a cada hora de cada dia.
É como um velório em dia de chuva, quando a água não vem para lavar almas, mas para derrocar os poucos que permanecem de pé. Já foram a um velório à chuva? É como se o dia se vestisse a rigor, e as nuvens pesassem mais que todos os corações carregados daquela dor, que só é comparável à dos que acompanham o enterro seguinte.
Há um funeral na minha cabeça, e não sei o que vestir.
Quero vestir-me de amarelo e levar sandálias, mesmo com o tempo nublado. Mesmo que o cheiro a terra molhada se me entranhe os pés e a vida. Não quero guarda-chuva, nem agasalho. Também não quero chorar, se não sei quem choro.
Não há mortos, missas de corpo presente ou de sétimo dia. Mas há um funeral na minha cabeça. Como um ritual inventado para me fazer duvidar, definhar.
Não há-de tardar.
Hei-de pegar no vestido e nas sandálias, e fazer do funeral uma festa.